13.5.08

Rebelo e o aquecimento global



Marques Rebelo dizia leviano o clima desta cidade. Mal sabia que leviano ficaria o clima do mundo (talvez o próprio mundo). Derretem-se as geleiras nas pontas da terra, esfriam-se os trópicos, chove no deserto e o solo, onde, antes, adubando tudo dava, torna-se estéril. No Rio de Janeiro, os mais desesperados apostam que, em breve, o Grajaú será bairro praiano. Resta saber se a água vai passar ilesa pela Grajaú-Jacarepaguá. Um furto levaria o sal. Um acidente romperia as moléculas. Que mar seria esse?

Já ouvi dizer que repousa nessa visão certo alarmismo, pois não existiriam dados de um longo período de tempo e, portanto, não se saberia se a terra já não esteve mais quente do que está. Tudo não passaria de um ciclo sobrepondo-se a outro, situação que se reverteria no futuro.



Se o aquecimento global catastrófico for mesmo um fato, como deveremos agir? De um lado está o Protocolo de Kyoto (nome lindo, não acham?) e, de outro, a resistência a ele por parte dos estadunidenses. A gente esquece esse povo e trata de fazer nosso exercício de casa? Porém, se os bambambãs lá do norte estão se lixando para o caos climático, por que logo nós iríamos esquentar a cabeça? Trocando em miúdos: ou contrapomos nossa responsabilidade à irresponsabilidade alheia ou somamos nossa irresponsabilidade à deles.

Em sinuca parecida, vê-se metido o amigo ao perceber outro se afundar na lama. Ele bem pode partir do princípio de que a vida alheia não diz respeito a ninguém além da própria pessoa e conviver com o amigo enquanto este for sociável. Outra opção é partir para o ataque, fazer das tripas coração para tirar o camarada daquela barafunda.



Conheço um sujeito que, para salvar o irmão metido com drogas, pensou na seguinte estratégia: começar a puxar um fuminho com ele e depois, aos poucos, levá-lo de volta ao “caminho do bem”. Atualmente, são os dois uns senhores (no duplo sentido da expressão) maconheiros, sem trabalho e alcoólatras.

Falava de clima, falei de amigos. Tudo porque, matutando cá com meus botões de plástico, concluí que a estratégia dos países e a das pessoas miúdas que somos não se diferem muito. O irmão que foi salvar o outro poderia ter adotado tática distinta: meter-lhe a mão na cara e apostar no confronto e não no diálogo ou nessa espécie de aliança feita entre eles. No caso dos países, os que assinaram o Protocolo de Kyoto (lindo nome!) poderiam invadir aquele outro para dar um jeito na situação. A terra seria derretida em segundos, não se requerem esforço e adivinhações para concluir isso. Se as estratégias nos dois níveis (pessoas e países) podem não diferir muito, os efeitos, Deus me livre! O que significam dois irmãos vagabundos e decadentes perto de uma guerra mundial? Nadinha. Pouco mais de nadinha.



Continuo com o meu paralelo mequetrefe. A mãe de outro amigo, a partir de certo momento, começou a rezar para que seu filho morresse o mais breve possível. Imagine o quanto ela sofria com as barbaridades aprontadas por ele. Então me pergunto: será que sumir com a terra do mapa cósmico de uma vez por todas é melhor do que fazê-lo aos poucos, como é o nosso caso, ao continuar jogando ilimitadamente gás carbônico no céu de infinitos significados? Será a destruição, aos poucos ou de forma abrupta, melhor saída do que, conversando aqui e ali em busca de consenso, tentar salvar este planeta que deve ser lindo visto da lua? Quem saberá? Eu não sei.

Você se perguntará, não sem razão, aonde quero chegar com esse chove-não-molha tantas vezes bisado por outros, estes mestres no assunto e, portanto, tratando-o, ao contrário de minha crônica, de forma profunda, matando a cobra-problema e mostrando o pau-solução. Digo-lhe, leitor, expondo não só a mim, mas possivelmente a classe dos cronistas, que escrevi essa crônica a partir da leitura do Rebelo, que me encantou com a designação de leviano dada ao clima carioca, a qual quis espalhar por aí, compartilhando-a com você. O resto, bem, o resto é recheio de uma empada cuja casca é sua melhor parte.