ao Anthony
Almeida
A crônica não reserva
espaço para o pessimismo. Que uma melancolia débil ou uma tristeza perplexa a
visitem com cerimônia, aceita-se, mas não a queiram viva no pântano, no
inferno, na escuridão. A crônica é a voz espantada das cigarras, a presença inquieta
do sanhaço na jabuticabeira, o olhar baço da senhora que não sabe dar
informação na rua. “Dona, onde fica a loja de material de construção?” “Ah, meu
filho, tudo muda tão depressa.”
A crônica não
pode deter os guerreiros, mas faria bem ao mundo se lida pelos imbecis comandantes
de armas. Ela não tem força para reverter o conflito dos casais, porém, se
pudesse, sopraria em seus ouvidos um dos Noturnos de Chopin e a consciência de
que a vida, em potência, é um convite a amar sem interesse. A crônica não se
atreve a invadir os celulares e pedir a atenção de seus donos, mas, ora, se ganhasse
deles uma escuta pequena e fugaz, os devolveria aos mesmos celulares, só que amparados
e livres dessa espécie de busca eletrônica por salvação.
A crônica não
canta muito bem. Não dança nada bem. Gagueja. Baixa os olhos se está em evidência.
Por ser dotada de tantas inabilidades, ao falar, está certa de que suas
palavras são como as cores que habitam as efêmeras borboletas. Pretensiosa, sim.
A crônica almeja, nos minutos arrancados dos homens e das mulheres em sua
leitura, fazê-los esquecer a própria existência. Quem é, é o outro, aquele de quem
ela fala. Não pretende, com isso, tornar-se poderosa, ao contrário, sua ambição
é devolver a vida aos vivos.
A crônica é parente
das brincadeiras hoje esquecidas. Prima da amarelinha, meia-irmã da cabra-cega,
confidente do passa-anel, carrega a infância de todos, inclusive ou principalmente
daqueles dos quais ela foi subtraída. Por isso, comunica-se pelo coração e, de
leve, toca o leitor durante a conversa.
Falo das crônicas de um domingo sem sol. Mas talvez fale de qualquer uma: noturna, luminosa, pletórica, seca, de rua, de salão, ébria, careta. No fundo, todas sonham despertar no leitor o riso — o sorriso, na verdade.
Um comentário:
Muito obrigado! 😉
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