No dia em que a tristeza foi embora, fui acometido de outra maior ainda. Nos acostumamos a ser o que somos, ainda que ser ou não ser pertença a um mundo distante léguas de minha tímida crônica.
Não é assim, leitor? A gente é bobo, deixa de ser bobo, fica triste. A gente é alegre, perde a alegria, bem, aí é óbvio (existirão mais coisas entre a alegria e a tristeza do que meu vão devaneio é capaz de imaginar?). A gente deixa de ser pobre, a tristeza se impõe: ser rico se parece com uma dívida, sabe-se lá com quem, mais pesada do que a acumulada na mercearia da esquina.
Por que eu dizia tudo isso mesmo? Ah, sim! Nem era pela tristeza, apesar de ser um tico por ela. Era pelo fato de ser bobo. Sou bobo, bobinho da silva.
No meu caso, essa bobeira não está no meu DNA, nem é alguma herança "freudiana" passada de pai para filho como um rio correndo para o mar ou, ao contrário, como um mar recusando o rio. Fiquei bobo para não dar bandeira justamente com minha tristeza. Não fosse assim, ninguém me suportaria. Amarro bode diante de minhas inúmeras impossibilidades, mas também por causa da crueldade existente nesse país de crianças abandonadas e de adultos que as abandonam.
Rio à toa. Faço piada de tudo. Para não sucumbir, o escárnio. Sejamos bobos. É uma senhora saída.
Para ser bobo, basta ter inteligência. Não digo dessa congênita, matéria-prima dos gênios. Falo dessa outra que se acha largada na rua, no humor do carioca, por exemplo. É mais uma questão de rapidez, de atenção. Pois bem, quem cumpre essa premissa está a um passo de se tornar bobo. Quem não, não se desespere, talvez nada do que anime a minha tristeza avive a sua. Talvez você seja um bobo nato. (Não há nada de mau nisso, acho mesmo o máximo; invejo quem o seja.)
Ser bobo é uma opção. De foro íntimo, portanto. Raciocino assim: ou isso ou ficar carrancudo pelos cantos. Sei lá, carrancudo hoje, infeliz amanhã, suicida não mais do que de repente. Não mergulho em rio dessa natureza. Enquanto houver sexo, pão e circo (se for do seu agrado: sexo, drogas e rock'n'roll), vou vivendo, vivendo eu vou. Pode ser que um dia me veja lambido por cachorro, largado numa sarjeta qualquer, ouvindo dos transeuntes comentários do tipo: "Vai ser bobo lá na China". Feliz não estarei, mas, quem sabe, de tanto insistir, serei mesmo bobo, exclusivamente bobo, não só na casca, mas nela, na clara e na gema. Amém.
(PS. "La Reproduction Interdite" é de Magritte)
Um comentário:
estou no osso!
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