Para
Angela Bittencourt, que sugeriu a crônica
Dia desses, uma “notícia” no site de humor G17 registrava a provável ideia do Governo do Rio de Janeiro de mandar internar as
pessoas que costumam sentar-se ao lado da estátua do Drummond e conversar com
ela.
Numa conversa com Otto Lara Resende. |
Há duas maneiras de se ler a tal “matéria”. A primeira do
ponto de vista da crítica ao governo, podendo, por omissão no texto, ser o
municipal ou o estadual. Ambos, nesse tempo de urgência na arrumação da casa
para as olimpíadas e a copa do mundo, são alvo fácil dos humoristas. E os
políticos, aventurados como eles só, fazem por onde, seja não cuidando do bonde
de Santa Tereza, um dos cartões postais da cidade turística, seja deixando cair
sobre a vida pessoal, à medida que o particular se imbrica com o público, toda
espécie de suspeita. Tendo os políticos que temos, não é de todo descabido aparecer
do nada um decreto, ou mesmo uma lei, nos termos imaginados pelo G17. Pensariam
assim o prefeito e/ou governador: não cuidamos do bondinho, é verdade, mas
antes amealhar meia dúzia de mortos pelo caminho do que deixar esses perigosos
órfãos e viúvos de Drummond exibirem sua loucura à luz do sol na praia mais
famosa do mundo.
A outra leitura poupa os políticos, colocando-os na pretensa
matéria apenas como a azeitona com caroço da empada nossa de cada dia. Nesta leitura
sobressai a confiança, ou idolatria, que depositamos no Drummond. As colunistas
da Folha, o bêbado de uma foto famosa, eu, algum dia, você, talvez, e outros,
muitos outros já recorremos ou vamos recorrer ao colo em bronze do mineiro das
terras do ferro, que está em Copacabana, como o verdadeiro anjo torto, à
disposição de quem carece de consolo. Não basta abrir e ler seus livros,
precisamos do contato fingido e teatral, que a existência sem vida de uma
estátua permite.
Chacrinha, Drummond, Otto Lara Rezende, Pixinguinha, Noel Rosa,
Braguinha e Ary Barroso são alguns dos que ganharam estátuas espalhadas pela
cidade. Na maioria delas, os homenageados foram flagrados em momento de
intimidade. Drummond sentado no banco da praia; mineiramente, de costas para o
mar. Otto com o cotovelo na mesa do escritório, tendo à mão um livro. Noel pedindo
ao garçom para levar a ele uma média que não seja requentada.
Sendo as estátuas de personagens mais ou menos nossos
contemporâneos é justo que os visitemos. Que levemos nossos segredos para
compartilhar com quem compartilhou de certa maneira os seus conosco. Artistas
de modo geral falam de si o tempo todo, mesmo que não se possa ligar
diretamente sua vida a sua obra. Contam-nos segredos de forma tão dissimulada,
que um poeta, dos maiores, definiu seus pares como aquele que “finge tão
completamente, que chega a fingir que é dor a dor que deveras sente”. E
completa: “e os que leem o que escreve, na dor lida sentem bem, não as duas que
ele teve, mas só a que eles não têm.”
As estátuas, enfim, dão-nos à mão o que, sem elas, seria
apenas sonho: o convívio amiúde com nossos ídolos. Por tudo que estes
significam, falar com eles, mesmo em presença simbólica, não é loucura. Sendo
assim, concluo que o G17 estava mesmo de pinimba com o prefeito e/ou com o
governador. Aposto, e torço por isso, que humoristas continuarão na cola deles.
E não só na destes, pois os políticos andam extrapolando o contorno do
razoável. Merecem, portanto.
3 comentários:
Maravilha Xandovski. Acho que em vez de vaquinhas pintadas por artistas pops famosos ou não, deveriam criar campanhas para fazer o mesmo com pessoas de comprovada relevância cultural. Assim poderiamos todos bater um papo com os figuras e até pedir alguns conselhos. Imagina-te só uma estátua do Nelson Rodrigues toda cheia de cor e tals. Isso sim é que é obra de arte. E deveriam ter um banco ao lado para o companheiro de conversa poder descorrer com mais conforto.
Quanto as leis absurdas de políticos municipais, estaduais e federais, escuta só esta: aqui em BH estão querendo, através do ministério público, apertar o cerco contra os bares e restaurantes e endurecer a lei do silêncio. Dentre outras medidas, obrigar os estabelecimentos a fecharem as 23h. Taí um assunto que talvez interesse ao G17. É mole? Pois é, como diz um conhecido: é mole, mas sobe. saravá
Aroeira, clap, clap, clap também, e seja lá clap o que clap seja.
Lucas, como já até falei no Facebook, esse Ministério Público não bebeu e viajou na mandioquinha.
Os bares são patrimônio material e imaterial de Minas Gerais.
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