A moça que vai descer do ônibus antes de mim leva o celular
no bolso de trás da calça. Eu me pergunto a razão disso, não me parece natural,
muito menos seguro, haja vista que o aparelho fica metade para fora. No bolso
de trás, totalmente protegida, os homens, principalmente eles, levam a
carteira, sempre foi assim. Não, não e não. Meu pai, agora me lembrei
nitidamente, levava a carteira no bolso da frente, no da direita. Ele usava
daquelas calças cujos bolsos frontais são fundos, bem fundos, logo uma carteira
solta ali está seguríssima. Esse modelo é o mesmo que o Veríssimo disse em
crônica usar a vida toda e, por conta dessa fidelidade ter estado, em
determinados períodos, na moda e noutros fora. Veríssimo, mestre, você não
passa de um démodé, a calça com bolsos mais rasos está na crista da onda pelo
menos desde os anos de 1980. O Whatsapp demanda ter rapidamente à mão o celular, por isso a vitória da calça atual. De novo cometo uma
inverdade, o bolso curto existe, acabei de dizer, antes das redes sociais, logo
a causalidade é outra: não fosse o bolso raso, não haveria a rede social, em
particular o Whatsapp.
Todo casamento é um equilíbrio precário, seja o casal de que
espécie for: negro casado com negro, negro casado com branco, branco com
branco, europeu com asiático, velho com novo, homem com homem e mulher com
mulher — sem esquecer os poliamorosos e os transgêneros. Enfim, é da natureza dos
casais conviver com um perigo à espreita, não percebido, capaz de fazer com que
todos se equilibrem na corda bamba; sem sombrinha, acrescento. Sendo assim, os
casais vão, ao longo do tempo, criando suas defesas, quer dizer, aqueles que
não chutam o balde e voltam à doce vida de solteiro, essa falácia que
inventamos, uma vez que estar solteiro é um equilíbrio igualmente precário
estabelecido numa casa quase sempre suja, com a cama desfeita e a geladeira
vazia. Deixo as tergiversações de lado e vou ao que interessa, no caso o que os
números dizem sobre o casamento. A evidência, todos sabem, é que o curso de
dança é a última etapa do casamento. É tiro e queda: o casal se matriculou na
dança, o casamento chegou ao fim. Nada mais lógico: dançar na corda bamba, e aí
com ou sem sombrinha, é impossível, não se vê nem em circo.
O pão cai sempre com a manteiga virada para baixo.
Assertivas como essa vieram importadas de países que não sabem o que é pobreza,
digo baseado em uma razão muito simples: o pão cai não só da mão daqueles que
têm dinheiro para comprar manteiga, cai também de quem come pão com pão.
É dando que se recebe. Esqueçam, essa frase faz parte da
oração de São Francisco, este homem bom, mas ruim de prognóstico. O que mais se
vê é muita gente dando (ou sendo roubada) sem receber nada em troca. Descarto a
frase não por suas questões intrínsecas, simplesmente não serve ao meu
propósito. Busco outra então. O preguiçoso fica pobre, mas quem se esforça no
trabalho enriquece. Veja que esta é parecida com a outra, mas não escorre de
boca de santo, tem mais a ver com os senhores do mercado, esses que nos fazem
crer nisso e, por isso, nos fazem perder nossas vidas. Ó, céus, aponte aquele
que ficou rico trabalhando.
Apresentei, amigos, quatro teorias. As duas primeiras
científicas até a raiz, as outras, como demonstrado, pura balela, coisa de
ciência cansada. Em tempos de falsas notícias, tenhamos cuidado,
principalmente quando falamos de verdade científica, que se estabelece depois
de cumpridas várias etapas, que vão da hipótese ao teste e, em seguida, à crítica.
Enfim, ciência exige protocolos. Então, amigos, agarrados à ciência ou
desagarrados da ciência cansada me ajudem a responder à questão inicial: como
justificar o celular no bolso de trás?
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