Nos últimos dias, aprendi que as estrelas se formam por meio de gases, o que não é novidade para ninguém, mas para mim era até bater os olhos naquela tela de TV existente no elevador do prédio no qual trabalho. Nem bem li o enunciado, e o texto em si era apenas o enunciado, pensei: meu deus, nossos puns de hoje serão as estrelas de amanhã. Ao mesmo tempo, me lembrei de que o metano é um dos maiores responsáveis pelo efeito estufa. Qual o balanço afinal: mais estrelas ou mais buraco na camada de ozônio? Incapaz de responder, resta-me rogar aos céus para que caiba na cozinha do universo algum espaço para o delírio dos incautos.
Não que eu não soubesse, sabia e sei faz tempo, mas nos últimos dias reaprendi, a duras penas, sempre é a duras penas, que uma ideia se esvai facilmente. Havia fechado o livro que estava lendo ("Tirza", de Arnon Grunberg, publicado pela Rádio Londres) e me ajeitava para dormir quando uma insinuação de verso me tirou o sono. Poderia ser o início de um poema. O verso ligava o silêncio à imagem de um cão sem lua. A questão é que, sem ter me levantado e anotado a ideia, do possível verso só guardei essa ligação tênue entre o silêncio e um cão sem lua. O verso em si, se houve, foi perdido, um poema que poderia ter sido escrito foi abortado, ou melhor, nem foi concebido — ah, Onã, deus da infertilidade! Se minha ignorância permite até fazer piada com essa evidência de os gases formarem as estrelas, no caso da perda de um verso, eu — esse escritor calejado (ah, Onã!) e preguiçoso, colecionador de versos perdidos — transito além da lamentação e me puno. De que maneira? Não conto, não quero que alguns leitores sintam alegria por isso.
Dados o aprendido e o reaprendido, o que ainda pode aprender um burro velho feito eu? Ganhar dinheiro. Vestir-me bem. Arrumar o cabelo. Cortejar uma dama. Rir sem motivo. Engraxar os sapatos. Falar inglês e/ou javanês. De todo modo, falar pouco e na hora certa. Pescar. Ter espírito crítico. Aderir a uma causa. Cantar no tom e sem errar a letra. Piscar um olho só. Chutar de canhota. Chutar no gol. Dançar de olhos fechados. Beijar de olhos abertos. Ler Ulysses.
Caramba, faltam muitas coisas, vou precisar de mais umas três vidas. Filho de mascate, mascatinho, portanto, proponho uma barganha: aceito morrer no espaço desta vidinha mesmo, mas, em troca, exijo que os ratos que roem os nossos queijos, sapatos, calcanhares, calças, que roem as nossas vergonhas, cuecas, barrigas, camisetas, que roem os nossos queixos, brincos, cabelos, chapéus, que roem nossa decência, enfim, roam uns aos outros até se consumirem. Como isso não acontece assim, de graça, cada um que arme sua ratoeira, recolha seus ratos e os envie para aquela gaiola, o xilindró. O voto (ou o não voto) bem pode fazer esse papel de armadilha.
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