Ponho os pés na calçada de
Ipanema e, lá do Leblon, vem o homem que já foi bonito. Na realidade, ele não
perdeu a beleza, mas, depois de longo debate com seus botões e travesseiros, concluiu
que a beleza foi coisa de antigamente. Da juventude, de quando pegava geral. É
um senhor bonito e, se ainda se entrega à conquista, continua pegando geral,
mas não mais as garotinhas. Isso é que o incomoda e que, à própria vista, o
torna feio.
O alemão passa com uma de
nossas negras. Nem é a mais bonita, mas, para ele, basta que seja negra.
Conjecturo: o mundo ficará melhor à medida que arianos se acasalarem e
procriarem com negros. Um passo a mais, deparo-me com a francesinha de mão dada
com um de nossos negros. Rogo para que sejam histórias de amor — ou uma
aventura apenas — e não turismo sexual.
Jovens hoje são espertos e preparam-se
desde cedo para a velhice. Ao colocar nos ouvidos um som bem alto e travar conversa,
aos berros, com o colega do lado, aprendem a conviver com a surdez. Dizem que,
precavidos, tomam Viagra.
A mulher fala ao celular. Ao
terminar a conversa — em atitude correta, pois não há motivo para manter as
mãos ocupadas —, enfia a engenhoca na bolsa. Entretanto, feito isso, ela se
espanta, se contorce, tenta se esconder. Sem o celular agarrado à mão, passou a
se sentir nua, embora, claro, não esteja. Outra pede que o parceiro ligue para
o celular dela, é o único jeito de encontrá-lo na sua maldita bolsa. Rápido,
ela diz, estou à beira de um ataque. Não estamos mais falando de um simples
aparelho de comunicação, compreende?
O casal não se suporta,
quarenta anos de um casamento terrível. Mas toda manhã caminha na praia.
Conversam muito.
Um ex-prefeito passa de mãos
dadas com a esposa. Estão bem velhinhos. Ele, agora, é escritor e, pelo jeito,
enquanto caminha, maquina um conto.
Ainda existem as bichas
exaltadas, vendendo alegria. E também a menina que passeia com o amigo gay, o
único cara que realmente a entende. Porém amizades desse tipo vêm sumindo do
mapa da afetividade. Os gays andam em crise com as mulheres, com o jeito de ser
delas. É uma hipótese caricatural.
Dez horas da manhã, e é
possível encontrar, nos quiosques, pessoas que são restos da noite anterior. Uma
delas, o cara com calça arregaçada e sem camisa, com olhos vermelhos e consciência
limpa... Por enquanto.
Ando ao lado de um sujeito
que nada desse mundo tira-lhe a gravata. Com bermuda, camiseta e tênis, ele caminha
com passo firme na companhia de um amigo. Conta toda sua semana, os negócios
que fechou, os que vai fechar. A gravata está pendurada no córtex do seu
cérebro. Talvez ele nem saiba que, à esquerda, quando se vai para o Leblon, e,
à direita, quando se vem, vaivém o mar.
Passa a mãe, desesperada
porque a babá pediu-lhe que segurasse a criança por dois minutinhos, o tempo de
amarrar o tênis. É a primeira vez que mãe e filho se tocam desde a cesariana
asséptica feita num hospital com cara de hotel. (Não, não é verdade que o
pimpolho beire os 35 anos. Maldade!)
Tem uma turma que joga
futevôlei bem demais. Há partidas de homens contra homens, de mulheres contra
mulheres e de times mistos. Nestes, é cada mulher forte, benza deus, Deus,
DEus, DEUs e DEUS.
A tatuagem deixa ver um
pedacinho da pele original da garota que, com certeza, era linda na sua versão
sem tinta. Noutra jovem, a tatuagem, discreta, faz assim na minha cara: slapt,
slapt, vê se aprende. Aprendi: quando bem-feitas, as tatoos têm lá seu
borogodó.
Certas pessoas foram
engolidas por seus óculos, inclusive a guria de nove anos, se tanto.
Um economista famoso, que as
más línguas dizem ter ficado rico com a herança do sogro, passeia muito mal
vestido. Quer dizer, não mal vestido, mas as meias sintéticas quase alcançam os
seus joelhos. Provavelmente viveu nos Estados Unidos da América.
Paulo Caruso por ele mesmo
(http://vilamundo.org.br/2011/03/paulo-caruso-uma -trajetoria-de-vida-desenhada-pela-vila/)
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Quem sou eu? Um mineirinho na
praia, prato cheio para todo tipo de ironia: rabiscada, gargalhada, escrita, cochichada
ou só pensada. Além de tudo, metido a besta, crente que abafa com essa
caricatura de crônica. Se eu ainda fosse o Paulo Caruso. Ah!, se fosse ele,
economizaria esse montão de palavras, trocando-as por dois traços assim e
assado. E estava dito.
Agradeço ao Paulo Caruso por permitir ilustrar minha crônica com suas autocaricaturas.
7 comentários:
assino embaixo que "taí gostei!"
Você é o Paulo Caruso, o das caricaturas em forma de letras. Um mineirinho que também é carioca - mineiroca, como se sentia a Haydée. E metido a besta. Será? Nada disso, abafa, sim, com essa caricatura de crônica. Genial! E está dito.
Adorei!! Caruso e Alexandre juntos, dupla perfeita.
Xandon, querido, delicia de caricaturas, como diria o Lan, cariocaturas. Ando pelas ruas assim também, a pensar sobre as atitudes e imaginar as vidas das pessoas. É divertido e, por vezes, nos faz deparar com quem sou eu. Adorei passar por aqui. Beijo.
Udo, Teresa Cristina - Madrinha só pra mim - Paçoca e Shirley, obrigado pela visita. Fico feliz de terem gostado dessas caricaturas feitas às pressas. O bom, bom mesmo, foi a sorte de poder contar com as verdadeiras caricaturas do Paulo Caruso, um craque e tanto.
Xandão, eu diria que vc tá parecendo aqueles bons vinhos , que devem ser colocados em odres de carvalho, que se tornam cada dia melhores... amei esta "Caricatura". bjs
Tia Beth, obrigado. Gostei de parecer vinho, já que não posso bebê-lo, então é melhor sê-lo.
Beijos.
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