Número Um
Mandararn? Eu
fui. Está aqui a agulha perdida no palheiro.
Número Dois
Ir até lá. Eu
queria, e pronto. Juntei as forças, abri as portas. Não brindei despedidas ou
apertei mãos, prometendo espaço dentro de mim.
A estrada era um
rascunho de deserto. Mas não sofri o sol nem tive sede. Deixei a poeira levantar-se
e não virei o rosto para ter certeza de que ficava para trás o que ficava para
trás.
Nenhum problema
maior. Um ou outro carro na contramão, uma friagem na madrugada. E só. Cheguei.
Encontrei
aquilo que eu queria. Comprei o que pude; o resto roubei. Montei meu reino.
Construí os castelos, os porões, as estrebarias para os corcéis de guerra,
raptei a virgem. Tudo pronto. Ordenei que descessem a ponte. E, estranho, tive medo
de entrar.
Número Três
Na comunhão do
pó, forjo alegria. A lâmina risca os trilhos, o corpo recebe a dádiva. Eu
danço, ele dança, nós dançamos. Um carnaval simulado. O sorriso nos lábios é
anúncio de pasta de dente. O aperto de mão, negócio fechado. Tenho o controle do
leme, mas a sensação de que no barco sou caroneiro.
Amanhã, o
último confete estará colado ao peito, ainda. Uma dor incorruptível. Não me devolverão
sequer um níquel. Abro janelas, cadê luz? Remexo minhas gavetas, e é um lenço
de Soraia, um cinto de Solange. Mas elas, elas mesmas, não estão aqui.
Carregaram a lembrança do meu peso, regaram-se com meu jorro, na melhor das hipóteses.
Com que pernas
vim dar nesse porto? Eu era moço, viril, e isto bastava. Mas se futuco mais, esgarçando
o tecido do colchão, riscando a tinta da parede, abro caminhos. Sigo pelas
frestas e molas, nos vazios possíveis. Pronto, tenho ao alcance das mãos. Pego.
Aperto. Ai!
Uma minhoca
veio viver na minha cabeça. Depois, uma outra, e outra, e outra. Na louça dos meus
dentes, cáries. Nas pessoas de ouro, carne. Meus sonhos, imagens desfocadas na
lente que é puro mofo.
Número
quatro
Não restaram
nem os ratos; estou só. Parece, assim mesmo, que é o início da festa. A madeira
do chão range, pisoteada por passos que já fugiram de mim. No tanque, a roupa
úmida cria bolores, meu retrato com cheiro. O som da gota que cai
ininterruptamente convida para mais uma dança. Aceito. Apago as luzes, e me
solto. Vou-me desfazendo, novelo. Meus fios não viram nada, casaco, colete ou
luvas. A última convidada me recolhe, com vassoura e pá. Lança-me no Azul.
Número Cinco
Eu chovo.
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