1.10.18

Mais uma crônica política

Num evento em Recife, partidários da candidatura que pouco compromisso tem com a democracia cantaram assim: “Dou pra CUT pão com mortadela / E pras feministas ração na tigela / As minas de direita são as top mais belas / Enquanto as de esquerda têm mais pelo que as cadelas”. É uma cançãozinha divertida, uma troça contra o lado de lá? Não. Apesar de o verso da CUT ser até engraçado, a parte que visa às mulheres é um desastre. É um acinte. Um crime.

O senhor que encabeça essa candidatura menos de direita do que antidemocrática, a meu juízo, comete muitos crimes. Lembro-me de seu voto no impeachment de Dilma Rousseff, que foi dedicado ao coronel Ustra, conhecido torturador. E ainda está vivo no noticiário o que um de seus filhos fez circular em seu perfil em uma rede social: uma foto que simulava a tortura de um homem que tinha na camiseta a hastag #elenão. Lembro-me de suas palavras dirigidas a Maria do Rosário, deputada do PT do Rio Grande do Sul. Se alguém já se esqueceu, ele dizia que a deputada não merecia ser estuprada porque era feia. Lembro-me ainda da resposta dele a Preta Gil no programa CQC. Ela havia lhe perguntado como reagiria se um filho namorasse uma negra, e ele disse que não se pronunciaria sobre promiscuidade. Até onde sei, tortura, estupro e racismo são crimes neste país, logo é crime homenagear um torturador ou dizer que, fosse outra mulher, se poderia recorrer ao estupro ou que é promíscuo o namoro de um branco com um negro. Há exemplos da artilharia retrógrada lançada contra a comunidade LGBT. A guerrilha em prol do atraso é suja e interminável e, nela, o capitão é general.

Se me espanto com esse viés de conservadorismo obscurantista, também me espanto com outras ideias que ele e seus seguidores lançam esparsamente. Por exemplo, que, no futuro, se poderá fazer uma constituinte sem políticos, uma coisa de escritório, melhor dizendo, de quartel. Que, se desfavoráveis, os resultados das urnas serão contestados com força. E aí a força são as armas que generais e capitães têm sob controle. Quase sob controle, haja vista que muitas delas são desviadas sabe-se lá como e vão parar nas mãos de bandidos.

Esse “cardápio” que nos é apresentado vai de encontro aos valores que cultivo. Estou aliado às lutas femininas, dos negros, da comunidade LGBT, ando ao lado dos defensores dos direitos humanos e acredito fervorosamente nessa contradição ambulante chamada democracia. Na democracia há ou pode haver corrupção, sim. Na democracia há retrocessos, sim. Mas, no saldo geral, é nela que avanços sociais e econômicos têm mais chances de acontecerem. A nossa, de 30 anos, é cheia de exemplos: combate à inflação, diminuição ainda que temporária da concentração de renda, maior nível de escolaridade, a despeito do nível baixo do ensino, e por aí afora. Se, no momento, houve tropeços, é hora de insistir na democracia e não dar as costas a ela.

Mais uma vez, ocupo este espaço para me posicionar contra uma candidatura que refuta os avanços que tivemos. Mas, por favor, não pensem que acredito no discurso “não houve nada disso” do PT. Sinceramente, não é por aí. Tenho muitas insatisfações, só não abraço a barbárie. Aliás, por isso, termino minha conversa com a dúvida que não quer calar: Quem matou Marielle e Anderson?


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