1.5.17

Passeio na praça

Ponhá o vestido novo, cosido enquanto cozinhava a vida em pano-maria. Botá o batom no tom, o esmalte mate, sem esquecê o colar e os brincos, tudo numa harmonia só, dessas de dá dó das dondocas bem-nascidas, mas sem encanto. Suspirá do jeito de uma avó avoada com a cabeça no vai de uma valsa que não foi. Enfiá os pés na rua, como se fosse montá numa quimera, e montá de fato e em pelo.

Passá pelo adolescente e dá de ombro, se perdê com menino, nem na imaginação. Endireitá o corpo na frente do bar dos mal-afamados e ignorá o “vem cá, teteia”, não é disso, dessas, ora! E chegá na praça, sentá no banco, afugentá uns monstros que coisam nela mané de hoje, é dum ontem sem tamanho que emendou todo o antes ao agora. Sentada no banco, protegida pela árvore que viu tudo aqui ganhá existência, te pego. E dô jeito. E desembaraço. Rumina a vingança, já empurrando o corpo pra rua.

Dona Lurdinha, dona Mercê, menina Júlia, elas todas banando a mãozinha de longe. Bana de volta, mulheres que nem ela, hospedeiras de suas desconjunturas, mais que desconfia, pode apostá. Proseá a respeito é que não. O silêncio sabe usufruí da própria sabedoria, então ela se arma é de psiu.

No caminho, afunda na esperança, essa rameira que se desmete com a morte. E da calçada sobe um bafo de otimismo, agora vai, ah, se vai. Batuca os dedos na coxa, espia o anel vermelho e, por ele, manda uma mensagem pra mãe: Num se espante.

Gosta da praça daquele jeito: vazia, vazia, vazia. Vazia, vazia, vazia ela também é. Olha de novo a praça e se pergunta onde é mesmo que aquela árvore não cansa de sombreá. É pra lá que vai caminhá com toda firmeza, a ponto de o vento se escondê do tempo, o calor tropeçá no céu, a cigarra chichiá pra dentro e a tarde nem pensá em anoitecê.

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