Para Teresa, professora num país triste
Nosso entrevistado de hoje, eu mesmo, nasceu em Minas, viveu em Minas, mas não parou aí. Mudou-se para o Rio, depois para São Paulo, de onde voltou para o Rio. Na infância, interiorano ainda, devaneou que viveria em Porto Alegre, quem sabe em Montevidéu, mas isso nunca aconteceu e está longe de acontecer. O destino não se importa com sonhos sem pé nem cabeça de um moleque qualquer. O destino é sério, sério. Que nem Teresa, a professora de francês com quem o entrevistado não aprendeu nada, de francês, devo dizer, pois foi com ela que ele começou a apreciar a beleza farta. Veja bem, não a beleza, mas a beleza farta.
Feita a apresentação, vamos à entrevista.
P: Alguma certeza na vida?
R: Sim.
P: Qual? (Capricho no tom irônico.)
R: Estou vivo.
P: O senhor conhece alguém que, não estando vivo, seria entrevistado?
R: A Tomie Ohtake. Um deputado espera por ela lá no congresso. Te digo mais, não é um caso isolado, tem morto espalhado por aí que tem muita explicação a dar, portanto, se não está, deveria estar sendo entrevistado.
P: Voltemos um pouco. Falemos de suas certezas. Além de estar vivo, outra?
R: Não estou morto.
(A entrevista será difícil...)
P: O fato de o senhor estar vivo e não estar morto me alivia. Agora, devo me explicar: ao fazer a pergunta, gostaria de saber se o senhor tem alguma certeza política, por exemplo. Tem?
R: A política é um bom negócio.
P: Do ponto de vista financeiro?
R: Aí já não sei.
P: Então em que sentido a política é um bom negócio?
R: À esquerda e à direita. Em todos os sentidos, entende?
P: Creio que sim, senhor, creio que sim. Mas, sejamos mais explícitos: o que o senhor acha do Temer?
R: Que ele se acha.
P: Só isso?
R: Achar, só isso, no mais eu torço.
P: Por ele?
R: Contra.
P: Quer dizer que o senhor é a favor do PT, do Lula, da Dilma?
R: ...
P: Quem cala, consente...
R: Ou se segura para não partir a cara de entrevistador tão bitolado. Com vinte e seis letras é possível escrever todas as palavras do mundo, com dez algarismos, todos os números. Não reduza a complexidade a a e não a ou a zero e não zero.
P: Devemos mudar de assunto?
R: Você deve.
P: Sugira algum.
R: Teresa.
P: A professora de francês?
R: Ela mesma.
P: Teresa está ligada a quê?
R: Ao amor.
P: O senhor a amou?
R: Não, mas todo homem deveria amar uma mulher cujo marido é um caminhoneiro.
P: Isso é uma filosofia?
R: De jeito algum, é uma frustração.
O entrevistado sai da sala e enfia-se no quarto. A entrevista, tudo indica, vai ficar assim, borocoxô, inconclusa. Ao recolher meu material, ouço-o chorando. Chora e murmura um nome. Teresa? Não, Teresa não, soa como se fosse o nome de um país triste.
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