29.4.10
Alguns dos meus amigos
Um mandruvá letroso inoculou em meu amigo, então pititinho, um zê de ipsilone como se fosse o xis da questão. E ele, envenenado e carcomido de letra, viu-se fonêmico. Em seguida frasal. Descambou em poético. Uma lua cheia de costa pro vento sonhando com marés quadradas nas hipotenusas menores do sol sustenido. São os nostálgicos do amanhã sem ontem os únicos a entendê-lo. Embora nem sempre.
AR
Tem morada naquela cabeça o gosto de amplitude infinita. Ah, talentoso! Ah, conquistador! Ah, justo! Na linha da história, sua ciência, nossa amizade será não mais do que alguns pontos, todavia fortes, pois deles alimenta-se a linha inteira (soma enfim) na qual negros chegam ao poder do Império e marginalizados ganham voz. Meu amigo, que busca fixar justiça no que será história, semeia na militância o sorriso e a sensibilidade artística, deixando a dor, sua miserável companheira, longe disso, como se nunca houvesse existido.
HSN
O único erro que não se deve cometer é acertar sem errar. Errar uma segunda vez é como lambuzar-se de manga toda vez que se chupa uma. É inevitável caso não se disponha de garfo, faca e prato. E mesmo que se disponha, todos sabemos: uma manga chupada é melhor do que uma manga cortada e mordida com decência.
Aliás, não é no chão decente que brota saudável o fruto da criação. É no solo de lata enferrujada; no campo das dúvidas banais; nonde sobra esterco do belo. Se jardineiro é quem conhece e discorre sobre a ciência das flores e, indefectível, produz as mais vistosas e enebriantes, meu amigo não pode ser um deles. Mas ele é, eis o fato.
MJO
Não se é ator sendo-o. Talvez, sim, arqueando-se as pernas, por si só arqueadas, ao rir-se triste das dores que o lugar fora do palco impinge em cada um de nós. O buraco é mais embaixo da unha. Ele sabe, mas prefere pensar de outro modo, ou melhor, gostaria que o buraco não fosse ali tão perto dos dedos que apontam, que agarram, que coçam e caçam. O palco poderia ser o buraco.
MTC
Ele dorme acordado. E acorda dormido, momento em que afunda os meninos e as meninas que sabem só um cadinho raso da vida nos próprios sonhos. Neófito, sempre volta ao local do crime, e ali encontra a fuga adulta da infância nas digitais do que será, para todos, nostalgia impalpável. Chora e, choroso, dorme acordado para acordar dormido e redescobrir a seta do início com a cabeça no rabo. Repisa.
NV
Quem estuda seus passos de ritmo moderado apreende a utilidade da mochila — sempre às costas. Nela se acomodam o verso futuro, o desenho por se desenhar, a música em gestação e ainda o passo rápido que um dia animará seus pés, fazendo-o chegar a si mesmo.
PB
Descobriu a poesia entre os presos. Como era ele o carcereiro, ofereceu a ela a oportunidade de viver livre, desde que se encarcerasse nele. Ali ela está, e bem cuidada. Não são felizes porque poetas e poesias não o são. Nem querem sê-lo.
RT
Nada escapa de seu olhar, e este comanda a mão. E das mãos uma peça se fará visível a outros olhos. Não será peça para deleite, mesmo que bela, pois toda beleza questiona e confunde. Será panfleto de um artista deslocado, cuja compreensão alcançaremos se e somente se estivermos também pisando no deslugar.
SF
Sob o boné, a urgência. Dela, manuscrito, um trapo lavado a seco e sua mensagem dúbia, mas sem rodeios. O álcool dos mimeógrafos sempre deu algum sentido aos poemas marginais, e esses subverteram os poetas que escapavam aos revolucionários. Brotou dessa guerrilha sem armas outra geografia das ruas que se pensavam apenas como concreto e traço. Ele, capitão temente aos recrutas rasos, sugeriu a direção na qual o norte seria apontado. Com isso a bússola engasgou e, vesga e soluçante, deu-se a ler.
SS
O inominado ele chama pelo nome de guerra. Assim, Judith é, na lembrança da primeira comunhão dele, a nave da igreja vazia e o desgosto do corpo de Cristo sobre a língua. Penélope é a meia trava que o atacante, ser intuitivo, dá temendo os conhecimentos de cantos e ângulos que o goleiro possa ter. Isocléa é tudo o mais que está no cesto do inexplicável. E Isolda, aquilo que porventura escape do cesto.
XM
Todo vegetal brota em sua mão. Por isso, sua visão de mundo, em barquinho de papel, escorre esconsa pelo Aquífero Guarani. Os perdigotos de sua fala falam por si, em silêncio, deixando-se entreouvir seus sonetos brancos, de amor e de revolta.
28.3.10
Surpresas de 2010
23.3.10
Programa para 27 de março, no Rio de Janeiro
Amigos, a barbada é a seguinte: dia 27, no Cinemathèque de Botafogo (RJ), Rua Voluntários da Pátria, 53 - Botafogo – RJ, a boa é ir ao lançamento de "Como se não houvesse amanhã", da Record, coletânea baseada em músicas do Legião Urbana, mais precisamente do Renato Russo.
Mais detalhes, dê um pulo aqui.
6.3.10
Lançamento de livro
No dia 27 de março, daqui a pouco, rapazes e moças talentosos lançarão no Rio uma coletânea de contos inspirados em música do Renato Russo. Entre eles, meus amigos Sérgio Fantini e Mariel Reis. Será uma festa, vale a pena esticar as pernas até lá (veja o convite) e, de quebra, comemorar os 50 anos do líder do Legião. Eu vou.
19.2.10
Receitas talvez desnecessárias
Para dias noturnos
Para dúvidas políticas
Para alimentar os filhos
27.1.10
Nova resenha de "A câmera e a pena", por Ronaldo Cagiano
Livraria da Travessa
Livraria Da Vinci
ou
Editora Cais Pharoux
26.1.10
A inviável harmonia da vida
Secretário de Redação - Folha de São Paulo (5/12/1995)
Nada mal para um autor ter o livro de estréia prefaciado por João Gilberto Noll.
O aval de um escritor de peso, embora não signifique por si só garantia de excelência, torna a leitura da obra em questão quase obrigatória para quem se interessa pela atual produção literária no Brasil.
Em "Contos de Homem", Alexandre Brandão, 34, mineiro radicado no Rio, conseguiu a façanha _e a obra, para crédito do prefaciador e apesar da horripilante capa, não decepciona.
O livro é dividido em três partes. A primeira, "Duas Senhas Básicas", traz dez contos erguidos sobre uma estrutura, digamos, tradicional, em sua forma. O que neles mais toca o leitor _e toca forte_ é seu aspecto onírico, meio gosmento, radicalmente amargo e um tanto sanguinolento, fazendo lembrar _não por acaso_ "A Fúria do Corpo", primeiro romance de Noll.
Em "O Corpo Não Tem Memória", por exemplo, um homem se vê castrado e nos leva a mergulhar numa existência de "terceiro sexo", complicada, inaceitável até, mas mais próxima do que significaria um ser humano "ideal". Leia o seguinte trecho de "Encontro na Madrugada sem Lua", expressão do mesmo clima: "Agora sou eu. Beijo sua testa gelada. Podendo fazer mais, faço. Ponho o coração na boca e o mordo. O gosto é amargo, quase intragável. Para o que quero, a fome é maior. Engulo os braços, pêlos, olhos. Os nervos entram em meus dentes, sangrando a gengiva."
Não há meio termo: ou se gosta ou se abandona o livro de cara _o que não deixa de ser meritório para um autor que se apresenta como alguém cuja intenção é não fazer concessões.
Mas terá valido a pena ir adiante, ao menos para ler "Missa do Galo" (nova reelaboração do original machadiano), em que se afirma: "Mas antes da larva e casulo, a primeira quinta-feira, o café da manhã com mamãe. Acompanhou-me um vulto branco; longe de ser fantasma ou culpa, era o que não digo. Não por pecaminoso ou ridículo, mas para não perdê-lo".
A segunda parte, "Escurecimento do Material Poetográfico", talvez seja, como bloco, a melhor do livro de Brandão. São sete textos curtos, com destaque para a curiosa "A Quadrilha do Drummond", mistura do famoso poema do poeta mineiro com o clima da música "Sinal Fechado", de Paulinho da Viola: diálogos e vozes interiores simultâneas, com inúmeras iras e segundas intenções num trânsito engarrafado.
Por fim, em "Uma Só Confissão de Outras Tantas", a terceira parte, Brandão dá um (pequeno) espaço para o lirismo urbano e juvenil, ainda que, prisioneiro de seu gosto pela felicidade ausente, espete-o sem piedade página por página.
No conjunto do livro, assim, predominam o desencontro, o amor impossível, o ódio como "mola propulsora da vida", a entidade do sexo como incontornável tormento existencial. Tudo isso, numa linguagem que busca constantemente o poético, embora manchado de plasmas e pus e sangue.
No prefácio, João Gilberto Noll afirma: "...como profundo escritor quer muito além, quer por exemplo revolver e reavivar o drama humano com uma espécie de humor irado, quase bélico _este, sim, pertencente ao veneno purificador do ato artístico, esta experiência cheia de barbárie e estranheza e que toca, destemida, a nossa mais íntima e encoberta natureza".
PS: O livro marca a estréia de uma nova editora, a Aldebarã. Que seja bem-vinda!
A OBRA
Contos de Homem, de Alexandre Brandão. 143 págs. Editora Aldebarã (Travessa
do Passo, 23, sala 507, Rio de Janeiro, CEP 20010-170, tel. 021/220-6409). R$
15,00
Os dramas e gargalos do mundo da criação
10.1.10
As particularidades de janeiro
Num sábado, estávamos todos lá
A realidade é só um detalhe
A primeira novela, segundo Brandão, gira em torno de uma filmagem, sob a direção de um estreante. Só que essa filmagem esbarra na incapacidade da equipe em dar sequência ao projeto, devido a vários problemas. Já a segunda acompanha um grupo de escritores que, fugindo de uma oficina literária, resolve trocar seus textos e encontrar-se periodicamente para discuti-los. “As coisas vão andar, haverá discussões, quase cisões, mas depois tomarão um rumo peculiar com a chegada de um casal de velhos que, no início, ficará de longe observando o trabalho ruidoso daquele bando e, mais tarde, interagindo com eles, alterará a vida de todos”, conta o autor.
Leitor de Machado de Assis, Ernesto Sábato, Júlio Cortázar, Guimarães Rosa, Dostoievski, Luís Vilela, Graciliano Ramos e tantos outros, Alexandre Brandão confessa ainda que, ao criar suas histórias, quase nunca busca inspiração em fatos reais. Quando isso ocorre é apenas um detalhe ou outro que tira do cotidiano, para pontuar algum aspecto da narrativa. “Mas por incrível que pareça, no caso das duas novelas de A câmara e a pena, há muitas vivências minhas, ainda que nenhuma das tramas narradas tenha ocorrido realmente. Minha mulher trabalhou um bom tempo com cinema. Daí eu intuir um pouco como funciona esse mundo. Claro que é apenas intuição, mas aproveitei um pouco dela para fazer literatura.”
Além de se dedicar à ficção e à economia, como funcionário do IBGE, Alexandre Brandão criou o www.noosso.blogspot.com, embora confesse não ser um entusiasta da internet em se tratando da escrita. “Quando comecei a fazer crônicas para o jornal de Passos e para um outro, de bairro, aqui no Rio, achei que poderiam também ficar registradas em um blog”, explica. “No meu caso, ele só é conhecido pelos amigos mais próximos. Vez ou outra é que recebo a visita de um estranho ou do amigo de um amigo. Mas vejo que existe um movimento intenso nesse espaço virtual. Autores ‘nascem’ ali e depois migram para o livro. Existem sites que são interessantes. Verdadeiras revistas literárias. O meu é caseiro.”
A câmara e a pena
Narrativas que propõem ciladas e interrogações
Desponta um novo contista
30.12.09
Versos Íntimos - Augusto dos Anjos
12.12.09
Um Natal
2.12.09
Novo Blog Amigo
Vale a visita.
10.11.09
Notícias
Primeira: vocês podem conferir uma entrevista minha para a Ana Cristina Melo, aqui. Ana Cristina tem cuidado bem dos novos escritores brasileiros, e ela é também um desses.
Segunda: dia 11, em BH, a partir das 18 horas, na Livraria do Pátio Savassi (Av. do Contorno, 6.061, lj 235, São Pedro), lançamento de "O Espelho de Volódja", de Eduardo Filizzola. Vale a pena conferir.
3.11.09
À espera de um carnaval temporão
8.10.09
Hoje, o que sei da poesia
23.9.09
Nova Resenha de "A câmera e a pena"
O jornalista Nelson Vasconcelos fez uma belíssima resenha de meu livro. Confira aqui.
E vamos que vamos.
11.9.09
Brasil – il – il – il
(bigode retirado de: http://justwrappedupinbooks.wordpress.com/2009/08/02/sob-o-dominio-do-bigode/)
Neste exato momento, não consigo dar um exemplo concreto, mas arrisco a dizer que, do cronista maior ao cronistinha de uma figa, todos, quando tropeçamos, tropeçamos da mesma forma.
Isso não quer dizer que o talento se iguale nesse instante de fracasso. Um tombo de um Drummond tem o estilo do poeta; o meu, por sua vez, é só a queda desse corpanzil que cresceu, apareceu e ficou feiinho, feiinho.
Porém, neste país, assunto é o que não falta. Podem jogar os parágrafos anteriores fora, não servem pra nada.
Giro minha câmera pro Senado. Não, aí é covardia, e tenho poucas linhas, espaço insuficiente pra dizer tudo que está borbulhando por lá. De todo jeito, só de relance, vi aquilo que meus olhos preferiam não ver.
Vamos pra outro lado. O pessoal da cultura tem trabalhado com nota fria? Oh, meu Deus, que novidade! Só na cultura, é? Será que somos chegados a um desvio ou o sistema é que joga todo mundo no limbo? Deixa isso pra lá, mal saiu a notícia no jornal, no outro dia já se dizia que as empresas tomaram juízo, está tudo resolvido, uma beleza. Sou a velhinha de Taubaté que, depois de ver tantas sarneiras, ficou cega — de nascença.
Meninas passam pra cá, passam pra lá. Passam pra lá, passam pra cá. São pêndulos de relógios? Marcam que espécie de tempo? Essa crônica bem poderia chafurdar no lirismo, ficar na cola da beleza, ou falar do Nadinho da Ilha, que morreu dia desses, mas...
A gripe suína está tirando todo mundo do sério. A gente anda com tanto medo, que esconde espirro, quando não prende. Tente espirrar
Seria bom viver num país em que faltasse assunto pra crônica! Eu poderia fixar-me no pêndulo desenhado pela beleza das meninas, homenagear o Nadinho, com quem dividi alguma mesa de bar e de quem vi o talento em ação, ou falar da Serra da Canastra (veja a foto). Lá, o São Francisco nasce chiquito, chiquito. Ao contrário dos problemas do Brasil, que nascem grandes e ficam enormes.
Não tenho medo de cara feia, mas acho que o Pedro Simon fez bem em ter.
29.8.09
A câmera e a pena está por aí
No Rio, pode ser encontrado na Livraria Travessa, numa de suas lojas.
Aproveito para sugerir um site bacaninha, e não só porque já falou do meu livro, mas é legal mesmo, feito por uma moça antenada com a nova literatura. Clique aqui e chegue lá.
Lá no final do blog, tem uma ferramenta nova: um siga-me. Quem quiser botar a cara e dizer que acompanha as osseosidades aqui fique à vontade. Meu amigo, Udo, de Alemanha, vejam só, já está.
Por fim, agora resolvi botar umas frases no twitter. Roubo algumas de feras, invento algumas. Não são diálogos, falo sozinho. As frases transbordam pra cá, bem no canto superior esquerdo do blog.
Abraços,
11.8.09
Na Trave

Bem sei, leitor, você bate os olhos neste mensário, em particular nesta coluna mal vertebrada de nome “No Osso”, à procura de distração. Acho até que está preparado para encarar uma temática, digamos assim, menos solar, afinal de contas estamos no Brasil e refletimos sobre ele, sobre suas mazelas. Porém não sei se suportará minha conversinha mole de hoje.
Na realidade, escrevo para diminuir minha carência, para desabafar. Não tendo terapeuta, uso e abuso de sua boa vontade. Não me abandone, por favor. Não agora. Pode ser que daqui a pouco minha dor se mostre apenas uma indisposição, algo passageiro. Se for, pronto, oras, você terá me ouvido, e tudo terá passado. Uma boa ação sua. De meu lado, ao falar, vou me curando, é assim que funciona a coisa desde sempre, como bem sacou o velho e bom Freud.
Estou meio sem jeito. Para falar a verdade, sou caladão; não falo, tartamudeio. Já que você foi alçado ao posto de terapeuta ou confessor, uma de suas obrigações é ser paciente, embora seja eu o paciente. Esta frase, mesmo não sendo boa, me remete a Campos de Carvalho. Posso fazer uma digressão?
Sujeitinho competente o Campos de Carvalho. Quem o conhece não se surpreende com a afirmação. Quem não, não perca tempo com cronistas menores, vá a uma livraria (há tantas e boas na cidade) e adquira o livro com todos os seus romances que saiu pela José Olympio, ou compre-os um a um, pois a mesma editora os está lançando separadamente agora. Voltando à digressão, esse autor mistura de tal jeito os estados de loucura e de lucidez — qual a diferença entre um e outro mesmo? —, criando personagens que transitam entre esses mundos paralelos, que eu diria, sem medo nenhum: Campos de Carvalho descobriu não a origem da vida, mas, sim, o sentido dela. E a julgar por ele, a vida é realmente sem sentido nenhum, o que, aliás, aumenta nosso compromisso com ela, fazendo-nos aceitar seus caprichos.
Digressão? Estou fugindo. Vamos ao ponto. Leitor, o fato é que nunca fui bom de bola. Já me ocorreu de, num teste no infantil do Esportivo, jogando de ponta direita, driblar o lateral, entrar na diagonal, driblar o beque e, cara a cara com o goleiro, chutar para fora. Uma decepção. Para a torcida e para mim. Quando nos decepcionamos conosco mesmo o nome é frustração.
Segue daí... O quê? Como assim, acabou?
Tempo lógico? Era o que faltava. Você não é o Lacan, nem meu analista você é, oras!
Pena, logo agora que encontrei o elo perdido de tantas dores.